Segurando a mochila da moça que estava em pé ao seu lado no ônibus, Jussara conversava animada com a melhor amiga do dia, Tânia. Havia conhecido Tânia ao passar pela roleta, mas já a considerava uma grande amiga.
- Canseira, mulher! Credo. Esse ônibus sempre lotado, sempre! Se não fosse o aniversário da minha filha, eu não saía de casa, não...
- Aniversário da mais velha?
- Não. Da pequena.
- Quantos anos?
- Treze.
- Ah, então já não quer mais brinquedo. Já tá grandinha.
- Pior. A guria quer um celular. Comprei, né? Vou fazer o quê? É o futuro...
- Comprou um desses modernos?
- Ah, todos são modernos pra mim. Tal o tal de Detroid...
- Android.
- Isso!
- Ela vai adorar os aplicativos. Tem muitos!
- Tenho medo...
- Tem que ter mesmo. Tem muito tarado por aí.
- Credo, amiga! Não fala isso!
- É sério, Jacira!
- Jussara.
- Isso! E vai ter um monte de maloqueiros dando em cima dela. Te liga!
- Ai, já fico nervosa! Para!
- Depois tua guria se envolve com um traficante aí, engravida e já viu, né?
- Deus me livre!
- E o pior: capaz de ela ficar viciada que nem o marido! Ele vai bater nela, certamente! Ela vai acabar se prostituindo pra sustentar a criança, que pode nascer com sequela. Olha, se não nascer com sequela, vai seguir os passos do pai bandido: estuprar, matar, assaltar e o caramba! Vai acabar na cadeia o coitadinho.
Jussara desceu na parada seguinte, chorando. Mal pode despedir-se da amiga que a alertou dos perigos do mundo. Assim que chegou em casa, Jussara tomou toda a cartela de comprimidos que a gaveta guardava. Deu fim à vida, pois já não suportava o peso de ter um neto na cadeia.
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