sábado, 27 de fevereiro de 2016

Reforma Infernal

       Foi Lúcifer quem primeiro falou, diante do silêncio ensurdecedor.

- Esperava que alguém fosse tomar a iniciativa, mas perece que estava enganado...

- Olha, meu anjo, normalmente é o mais velho quem começa o falatório. Eu sempre fico esperando Anúbis falar, mas essa cadela fica fazendo a egípcia, faz de conta de que nunca é com ela! - Disse Hades, louco por um barraco. 

- Ai, miga, sua louca, você adora uma confusão, né?! - Riu, no fundo da mesa, Plutão.

- Que mania de roubar minhas gírias! Credo! Meu Diabo do Inferno, te liga, planetinha! Nem planeta mais tu é! Deveria ficar quieto em todas as reuniões e ser grato a mim para toda a eternidade, porque, se não fosse pela minha existência, os Romanos nem teriam criado você ao roubar a religião politeísta dos Greg..

- Chega! Gente, vocês são chatos. Que inferno! - Gritou Kali, entrando no salão e fechando a porta com um de seus quatro braços.

- É o inferno mesmo, "monamu"! Só a hindu frenética dos incensos que não se localizou...

- Hades, por favor, cala a boca. - Pediu Exu, que só observava com olhar de desprezo.


      Já era a terceira reunião naquele ano. Ninguém mais suportava. Estavam no salão principal do Submundo. Quando a coisa ficava feia, mas bem feia mesmo, num nível, digamos, infernal, os deuses da reuniam-se. Estavam todos lá, centenas, um de cada religião: Lúcifer, do Cristianismo; Anúbis, dos Egípcios; Kali, do Hinduísmo; Exu, das religiões da fascinante África; Hades, dos Gregos; Plutão, dos Romanos pré-cristãos; e muitos outros. Apesar da enorme quantidade de divindades, eram esses deuses que mais tomavam a palavra e as decisões. Perséfone, mulher de Hades, chegou por último e sentou longe do marido que, por sua vez, insistiu:

- Amorzinho, senta aqui com teu diabão...

- Cala a boca, Hades. - Respondeu ela, ríspida.

- É, grego, fica quieto. Todo mundo sabe que tu prefere o Hérc...

- E vamos dar início a reunião! - Interrompeu Kali.

- Bem, estamos aqui hoje porque a situação está caótica. O inferno nunca esteve tão infernal! Pior do que isso, só a Terra. Bem, estamos com pouco espaço e tem muita gente vindo aí!

- Mais gente?! Que horror! - Gritou algum deus que comia todos os salgadinhos da mesa.

- É, mais gente! Tem neonazis, bolsominions, uma galera! Estão vindo e ficarão pra sempre. Chego a pensar em adotarmos os sistema de reencarnação...

- Ah, não! Eu não mando Hitler de novo pra Terra, que homenzinho mais sem classe! - Proferiu Plutão.

- Temos que fazer reformas! Estamos com a mesma estrutura que Dante Alighieri criou, não dá mais. Chega! As pessoas já chegam aqui sabendo as torturas que vão receber. Alguém tem alguma ideia? - Lúcifer, assim, passou a palavra para os outros.

- Que milagre! Falou pouco hoje, Satã, Capetinha, Diabinho, Serpentinha...

- Hades, se não vai ajudar, não atrapalha. - Pediu Exu.

- Tá, parei, mas tenho ideias! Pensei em castigos novos! Podemos colocar um ônibus lotado, mas muito lotado, daqueles articulados, sabem? Podemos colocar a passagem a 3,75 e fazer um feitiço, de modo que, quando a pessoa chegue no final do ônibus, depois de ser espremida o caminho todo, ela simplesmente volta ao início! PARA SEMPRE!

- Boa, boa! - Disseram todos e todas.

- Também pensei em trazer aquela cantora, a Cláudia Leite, sabem? Colocar ela cantando aqui, pra sempre também. É só dar umas chocolates que ela...

- Ah, não! Eu não quero aquela menina aqui! Tudo tem limite! - Disse o deus que, após comer os salgadinhos, atacava os brigadeiros.

- Você não tem que opinar, tua religião sequer existe e...

- Olha quem falando! O filho de Cronos menos poderoso que...

- Gente, vamos tentar...

- Tentar o cacete, seu bosta! Eu agora vou falar tudo o que eu...

     Em questão de segundos, todos os deuses estavam brigando. A discussão durou alguns séculos e, após a reunião, nada ficou resolvido. O inferno continuava infernal, até parecia a Terra.